Do Pároco

A nova Exortação apostólica do Papa Francisco, Laudate Deum, sobre a crise climática, não parece ter suscitado no cristão comum um entusiasmo excessivo. Por quê?

Há muitas respostas possíveis, entre outras a de que a relação entre crise climática e vivência da fé não é evidente. Sobre esta última questão, transcrevo umas palavras de S. João Paulo II no início de uma das suas encíclicas sociais, quando esclarecia que ela recolhe princípios «que pertencem ao património doutrinal da Igreja, e, como tais, empenham a autoridade do seu Magistério». Ao mesmo tempo, também propõe «a análise de alguns acontecimentos da história recente. É supérfluo dizer que a atenta consideração do evoluir dos acontecimentos, para discernir as novas exigências da evangelização, faz parte da tarefa dos pastores. Tal exame, no entanto, não pretende dar juízos definitivos, não fazendo parte, por si, do âmbito específico do Magistério» (Centesimus annus, n.o 3).

Na Exortação do Papa Francisco Laudate Deum podemos aplicar o mesmo raciocínio. Nem tudo faz parte do âmbito específico do Magistério. Sugiro agora alguns dos princípios do Magistério incluídos ou sugeridos no documento.

1.«A Bíblia conta que «Deus, vendo toda a sua obra, considerou-a muito boa» (Gen 1, 31). D’Ele é «a terra e tudo o que nela existe» (Dt 10, 14)». Todo o mundo é criatura de Deus. Tiremos as conclusões: «esta responsabilidade perante uma terra que é de Deus implica que o ser humano, dotado de inteligência, respeite as leis da natureza e os delicados equilíbrios entre os seres deste mundo» (n.o 62).

2. O Catecismo da Igreja Católica, ao enumerar as consequências do pecado original, refere que «por causa do homem, a criação ficou sujeita à servidão da corrupção» (n.o 400). São palavras enigmáticas, mas que talvez à luz da nova Exortação possam tornar-se mais esclarecedoras: «os bispos africanos declararam que as alterações climáticas evidenciam “um exemplo chocante de pecado estrutural”» (n.o 3).

3. Alguns princípios morais a ter em conta:
– As nossas atitudes e comportamentos têm ou podem ter consequências para além dos imediatos efeitos visíveis. Neste mês de novembro, não deixemos de estender esta consideração aos sufrágios pelos defuntos, um bem que podemos alcançar para eles sem que o possamos constatar aqui na terra. No que ao nosso tema se refere, «tudo o que se nos pede é uma certa responsabilidade pela herança que deixaremos atrás de nós depois da nossa passagem por este mundo» (n.o 18).
– Nem tudo o que se pode fazer do ponto de vista técnico deve ser feito. Nem tudo o que temos à mão pode ser simplesmente usado. «Os recursos naturais necessários para a tecnologia (…) não são certamente ilimitados, mas o problema maior é a ideologia que está na base duma obsessão: aumentar para além de toda a imaginação o poder do homem, para o qual a realidade não humana é um mero recurso ao seu serviço. Tudo o que existe deixa de ser uma dádiva que se deve apreciar, valorizar e cuidar, para se tornar um escravo, uma vítima de todo e qualquer capricho da mente humana e das suas capacidades» (n.o 22).
– Pequenos gestos podem ir mudando atitudes de fundo: «Os esforços das famílias para poluir menos, reduzir os esbanjamentos, consumir de forma sensata estão a criar uma nova cultura» (n.o 71).

Convido a todos a lerem o documento do Papa.

Pe. João Paulo Pimentel