Do Pároco

Todos os cristãos conhecem a salutar advertência da primeira carta de S. João: «quem não ama o seu irmão, a quem vê, como pode amar a Deus, a Quem não vê?» (1 Jo 4, 20). Poderíamos perguntar-nos ainda se não amando o irmão que vemos seremos capazes de amar verdadeiramente aqueles que não vemos. Entres eles, as almas do Purgatório a quem a Igreja nos convida a amar mais durante o mês de novembro. Apesar de não os vermos e não conhecermos bem os seus sofrimentos.

Para um cristão habituado a deter-se diante dos sofrimentos daqueles que passam na sua vida, o convite da Igreja faz todo o sentido: há irmãos que não vemos mas que sofrem e podem ser aliviados pelas nossas orações. Também com eles podemos e devemos exercitar a caridade, seguindo as exigências do amor, bem sintetizadas por Bento XVI na Encíclica que o Sr. Patriarca nos convidou a reler durante este ano: «O programa do cristão (…) é um “coração que vê”. Este coração vê onde há necessidade de amor, e age de acordo com isso» (Deus é Amor, n.º 31). Um coração cristão, habituado a deter-se diante do sofrimento, estará em condições de reconhecer que Deus quis o Purgatório aberto à influência do nosso amor pelos que já partiram.

As orações pelas almas do Purgatório, para além de requerer a fé, exige de forma peculiar reforçar uma dimensão do verdadeiro amor: a gratuidade. «O amor é gratuito; não é realizado para alcançar outros fins» (ibidem). O bem que podemos alcançar para aqueles nossos irmãos que já morreram não é sequer comprovável: como é que receberam o dom das nossas orações? Que alívio terão alcançado e quem entre eles é que o alcançou?

Esse desconhecimento, impede o «gosto» que poderíamos sentir ao comprovar a eficácia da nossa ajuda, embora tenhamos a certeza de que o Senhor agradece e abençoa a nossa preocupação por eles. Daí que o amor às almas do Purgatório reforce em nós a convicção cristã do amor «apenas» pelo bem do outro e não pelo retorno que, de um modo ou outro, podemos obter, mesmo que se trate de um «retorno» compreensível, como a satisfação pela utilidade do esforço despendido. No caso da preocupação pelos defuntos, não conseguiremos «ver» o seu sorriso agradecido. Porém e precisamente por isso, amando de verdade o irmão a quem não vemos podemos aprender a amar melhor e de forma gratuita aquele que vemos.

Rezemos, pois, pelas almas do Purgatório, com o único intuito de os ajudar. Comprovaremos que amando os que não vemos, aprenderemos a querer amar os que vemos de um modo verdadeiramente gratuito, pelo seu próprio bem.